sábado, 20 de janeiro de 2018

Uma carta de Braga que já faz polémica nos Estados Unidos

Comentário


Apresentação da carta pastoral Construir a Casa sobre a Rocha 
(foto reproduzida daqui)
 
As orientações da carta pastoral Construir a Casa sobre a Rocha, apresentada na passada quarta-feira pelo arcebispo de Braga (e que aqui foi referida), já foram postas em causa nos Estados Unidos. Numa mensagem na sua página no Tweet, Edward Pentin, escreve que chegam notícias de uma conferência em Roma, a realizar em Abril, acerca das “divisões na Igreja” ao mesmo tempo que uma “arquidiocese portuguesa publica orientações sobre a AL [Amoris Laetitia], cujos críticos dizem ser muito próximas da proposta de [cardeal Walter] Kasper, que foi rejeitada pela maioria dos bispos no Sínodo sobre a Família”.
O cronista do National Catholic Register, uma publicação de orientação conservadora, admite implicitamente que não leu a carta de Braga mas alinha pela tese dos que têm defendido que as propostas do Papa em relação ao acompanhamento de pessoas e casais em dificuldade tendem a criar “divisão” na Igreja. Diga-se que, durante cinco décadas, as mesmas pessoas que agora se preocupam com isso não repararam na divisão surda, mas terrivelmente efectiva, que se deu com o abandono de milhões de pessoas. Para citar apenas um exemplo, foram muitos os que preferiram deixar de se considerar como parte de uma comunidade que   não lhes reconhecia a possibilidade de serem ouvidos no que à contracepção dizia respeito.
Agora, é sintomático que tão rapidamente chegue aos Estados Unidos a notícia do documento de Braga. É facto que, no grupo Actualidade Religiosa (um grupo fechado na rede Facebook), vários comentários também criticaram, nos últimos três dias, a carta pastoral de D. Jorge Ortiga: “É o desnorte total. De um momento para o outro, alteram-se ensinamentos da Igreja que levam séculos de debate e reflexão por parte de concílios, leigos, religiosos e santos”, escrevia António Frazão. “Documento absolutamente desastroso e catastrófico”, acrescentava Bernardo Motta, que, apesar de se manifestar “sem palavras” e sem saber “o que dizer”, ainda descobria o que escrever mais: “isto é chocante. Isto é o descrédito total da doutrina católica. É o total abandono das responsabilidades pastorais de uma Diocese inteira”.
Ora, é precisamente isto que estes argumentos revelam não entender: as “responsabilidades pastorais” remetem para a ideia do pastor. E o bom pastor, como se lê no evangelho, é o que dá a vida pelas suas ovelhas. É aquele que é capaz de deixar as cinco ou dez ovelhas que (ainda) estão no redil e sair à procura daquelas que saíram porta fora ou ficaram à porta ou bateram com a porta ou a quem alguém bateu com a porta na cara. A misericórdia e a situação de cada pessoa são, no evangelho, atitudes centrais. E é a recuperação dessas ideias que a carta pastoral de Braga tenta propor.

Num outro comentário no mesmo grupo, João Silveira diz mesmo que os autores da carta pastoral “terão de responder por isso em sede própria”. Que sede será essa? Um tribunal que acaso condene as pessoas a novas fogueiras como os silenciamentos, as perdas de emprego, a ostracização?...
Diga-se que nem todos os comentários surgidos são deste teor. Também na rede Facebook, Amaro Gonçalo Ferreira Lopes, elogia João Duque (professor na Universidade Católica, que escreveu um primeiro comentário sobre a carta do arcebispo, também aqui referido) e escreve que este será “um documento que vai fazer história na Igreja em Portugal e esperamos que faça caminho”. E igualmente no JN deste sábado, Fernando Calado Rodrigues refere a carta pastoral como reveladora de que Braga “está a ser pioneira ao olhar de frente para os problemas da família, em particular para os dos divorciados a viver numa nova união civil. Está portanto, desta forma, a corresponder aos desafios que o Papa Francisco propôs à Igreja na Exortação Apostólica “Alegria do Amor”. (O texto pode ser lido aqui na íntegra)

1 comentário:

José Dasilva, PhD disse...

"Deus escreve direito por linhas tortas" quando coloca a Diocese de Braga, exemplo secular de conservadorismo, na linha da frente do trabalho pela inclusão de todos na Igreja. DE TODOS. E isso contra o rasgar de vestes protagonizado pelos fariseus modernos "cujus deus ventre est", que sequestraram a Igreja durante séculos e pensam que o Espírito Santo deve pedir-lhes autorização quando sopra no sentido de que a Igreja seja fiel à sua missão de Mãe e Mestra.
Força, Diocese de Braga!