sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Culturas femininas e teologias feministas


Ilustração: Primavera, de Boticelli (pormenor)

O Conselho Pontifício para a Cultura (CPC) confirmou o tema da sua próxima assembleia plenária, que decorrerá em Fevereiro de 2015: Culturas femininas: igualdade e diferença será debatido pelos membros e consultores do CPC (entre os quais os portugueses D. Carlos Azevedo e José Tolentino Mendonça) e por convidados.
Questões como a “ideologia de género”, os “direitos das mulheres invisíveis”, a “espiritualidade da mulher”, “a igualdade e a reciprocidade” são alguns dos temas a tratar na assembleia, cuja sessão inicial é aberta ao público.
Aqui podem ler-se mais detalhes sobre a notícia e um texto do cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do CPC, sobre o tema.
O anúncio deste debate surge poucos dias antes da realização, em Lisboa, do IV Colóquio de Teologias Feministas, que decorre nos próximos dias 14 e 15. Sob o tema Franciscovai e reconstrói a minha Igreja que está em ruínas, o colóquio pretende debater a reforma da Igreja Católica. Na apresentação do programa, pode ler-se: “Move-nos o desejo de debater algumas temáticas ligadas à reforma da Igreja, nomeadamente, algumas interrogações, como, por exemplo, Que lugar têm as mulheres nesta reconstrução? Serão “o ângulo morto da reforma de Francisco”? Terão todas as reformas que passar por Francisco? De que estamos, realmente, à espera? O que esperamos?”
O colóquio realiza-se nas instalações de Lisboa do Centro de Estudos Sociais, da Universidade de Coimbra (Picoas Plaza). Entre as intervenientes, estão Maaike de Haardt, presidente da Sociedade Europeia de Mulheres na Pesquisa Teológicae as espanholas Marta Zubia Guinea e Roser Solè Besteiro. (Os objectivos, programa e ficha de inscrição no colóquio podem encontrar-se aqui)
Recorde-se que, no final de Setembro, o Papa nomeou cinco mulheres entre os 30 membros da Comissão Teológica Internacional (CTI), um organismo dependente da Congregação para a Doutrina da Fé.
Embora ainda em número reduzido, nunca antes a CTI tinha tido um tão grande número de mulheres, que passam a representar 16 por cento dos membros da comissão, criada em 1969.

As nomeadas – duas religiosas e três leigas – provêm dos Estados Unidos, Canadá, Rússia, Austrália e Áustria. Não incluem, portanto, nenhuma teóloga do mundo latino-americano, africano ou asiático.
A irmã Mary Prudence Allen, uma das novas nomeadas, dizia há dias em entrevista à revista jesuíta America que “a integração das mulheres em posições de colaboração mais estreita com os homens, na Igreja, tem sido mais evidente”.
Baptizada Christine Hope Allen, no estado de Nova Iorque, a família da irmã Prudence descende de uma comunidade religiosa utópica do século XIX. Christine converteu-se ao catolicismo em 1964, casou-se em 1965, criou dois filhos e ensinou filosofia na universidade. O casamento foi anulado em 1972, passando, em 1983, a ser a irmã Prudence, das Religiosas da Misericórdia.
Em entrevista ao site da Unisinos, a irmã Prudence diz que se considera “uma nova filósofa feminista na linha” do João Paulo II. “Com isso quero dizer que estou preocupada em ajudar a remover os obstáculos para o pleno desenvolvimento das mulheres em áreas de discriminação, exploração e violência – um desejo que é compartilhado com feministas de outras tradições.” E acrescenta que entende o seu papel na comissão como o de “enriquecer a compreensão da mulher na Igreja” (outros dados biográficos e a entrevista integral podem ser lidos aqui)
Consultor do Conselho Pontifício para a Cultura, o padre madrileno Pablo d’Ors é um dos membros do CPC encarregue de redigir um documento para o debate da assembleia de Fevereiro. Em entrevista ao site da Unisinos, Pablo d’Ors diz que é favor da possibilidade de ordenação de mulheres. “O facto de que a mulher não pode ser padre porque Jesus era homem e que escolheu apenas homens é um argumento muito fraco. É uma razão cultural, não metafísica”, diz.
Autor de A Biografia do Silêncio, editado em Portugal (um outro excerto do livro pode ser lido aqui e o posfácio, de João Paulo Costa, aqui), Pablo d’Ors diz, a propósito do tema desse seu livro: “Palavra e silêncio são os dois lados de uma mesma moeda. As palavras verdadeiras, aquelas que têm a possibilidade de tocar o outro, nascem do silêncio, ou seja, da intimidade com si mesmo. E chegam ao silêncio porque o mais belo, quando você lê um livro, é a necessidade de recriar, você mesmo, aquilo que você leu. No fundo, a literatura é um convite a se calar.”
Sobre a questão da ordenação de mulheres, acrescenta Pablo d’Ors na mesma entrevista, que “a mudança é necessária, até porque se trata de uma discriminação inaceitável”. E acrescenta, sobre os receios que existem: “A novidade sempre dá medo. Em vez disso, um critério importante para medir a vitalidade espiritual de uma pessoa é a sua disponibilidade para a mudança. Resistir à vida é um pecado, porque a vida é desenvolvimento contínuo. (entrevista na íntegra aqui)

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